terça-feira, 3 de agosto de 2010

Os 10 mandamentos do "divino mercado"

Os 10 mandamentos da religião (neo)liberal em veneração ao divino Mercado apresentados por Dany-Robert Dufour

a divulgação das teses de Dany-Robert Dufour não significa a nossa concordância com elas. Pensamos sim que o seu conhecimento permitirá um debate mobilizador sobre os efeitos da ideologia neo-liberal e a consequente capacitação crítica de quem resiste a mais este deus, desta vez sob a forma do divino Mercado.

Um novo deus subiu aos altares nas nossas sociedades contemporâneas, o Mercado. Um deus que se apresenta como um remédio para todos os males e que promete a felicidade eterna.

A religião, que o glorifica, esteve em gestação nos últimos 3 séculos e assistimos hoje aos seu triunfo e consagração.

10 mandamentos do (neo)liberalismo:
1) Deixar-te-ás guiar pelo egoísmo e entrarás alegremente no rebanho dos consumidores
Nota: o que equivale à destruição de qualquer individualidade


2) Utilizarás o outro como um meio para alcançares os teus fins
Nota: o que equivale à destruição de toda a «common decency»


3) Poderás venerar todos os ídolos à tua escolha, desde que adores o deus supremo, o mercado
Nota: trata-se aqui do retorno (e reforço) do elemento religioso

4) Não quererás ser um Kant-em-si a fim de escapares ao rebanho
Nota: o que equivale à neutralização do ideal ( isto é, do espírito) crítico


5) Combaterás todo o governo e serás tu a assumir a boa governação
Nota: este mandamento acabará por se traduzir na destruição da dimensão política substituída pela soma dos interesses privados


6) Ofenderás todo o professor que esteja em posição para te educar
NOTA: o que equivale à desconsideração da transmissão de saberes e ao descrédito do poder formador das obras


7) Ignorarás a gramática e maltratarás o vocabulário
Nota: tal conduzirá à criação de uma novlíngua


8)Violarás as leis sem te importares com isso
Nota: o que vai levar, paradoxalmente, à proliferação do direito e dos procedimentos quanto à invalidação de toda a Lei


9) Abrirás indefinidamente a porta já aberta por Duchamp
Nota: o que conduzirá à transformação da negatividade da arte numa comédia de subversão


10) Libertarás as tuas pulsões e procurarás uma fruição sem limites
Nota: o que equivale à destruição de uma economia do desejo e sua substituição por uma economia de fruição

domingo, 20 de junho de 2010

O Deus do mercado

O mercado é o deus do mundo pós-moderno, diz o filósofo francês Dany-Robert Dufour. Não, ele não usa uma metáfora, mas faz uma afirmação literal. "É preciso não esquecer que o mercado não é uma invenção dos mercadores, mas de teólogos", afirma. "O que era justamente o caso de Adam Smith, como hoje se sabe."

A reportagem é de José Castello e publicada pelo jornal Valor, 14-08-2009.

O economista e filósofo escocês Adam Smith (1723-1790) foi o primeiro a falar a respeito de uma "mão invisível" que levaria o mercador ou negociante a, mesmo sem decidir isso, "fazer o bem". Afirma Dufour: "A expressão que emprego - o divino mercado - não é uma metáfora, ela deve ser entendida literalmente: está postulado que existe uma religião natural". De acordo com ela, não é preciso ceder à santidade; basta deixar agir o interesse privado.

"O Divino Mercado" é justamente o título do mais recente livro de Dany Dufour (Companhia de Freud, tradução de Procópio Abreu). Nesse novo ensaio, Dufour, que é professor de Ciências da Educação na Universidade Paris VIII e diretor de programa no Colégio Internacional de Filosofia, desenvolve algumas das teses já tratadas em "A Arte de Reduzir as Cabeças", estudo sobre a nova servidão na sociedade ultraliberal (Companhia de Freud, 2005, tradução de Sandra Regina Felgueiras). Como pano de fundo dos dois livros, os efeitos da grave crise econômica que sacode o planeta.

Por que um filósofo se interessa pelo estudo da sociedade ultraliberal contemporânea? O motivo é simples: no seu entender, o salto do liberalismo clássico para a sociedade ultraliberal produziu, além de mudanças radicais na realidade econômica e social, uma drástica alteração na noção de sujeito. Ela mudou os parâmetros a partir dos quais o sujeito se constitui.

"As mudanças na economia mercantil não são tão inócuas para a economia psíquica", diz Dufour. Mudou a economia, mudou o sujeito que nela se movimenta. O antigo sujeito que chegava aos consultórios de psicanálise era, em geral, um indivíduo "crítico e neurótico", isto é, guiado pelo desejo de compreender e pela retenção de suas pulsões. Problemas que levava para seu analista.

Afirma Dufour: "O novo sujeito que hoje se apresenta é acrítico e pós-neurótico". Compreender não lhe interessa mais, é algo que, antes disso, o entedia. O mercado promete atender a cada um de seus apetites - logo, em vez de reter as pulsões, ele as "resolve" com o vício, o mais frequente deles por drogas. Esse novo sujeito, acrescenta Dufour, "é levado a adotar condutas perversas (instrumentação do outro em função de seus gozos e interesses pessoais)". E, consequência final, "se ele não consegue fazer isso, ele se deprime, o que acontece frequentemente".

Drogas, perversão, depressão - marcas de um novo sujeito, figura típica de um mundo onde os padrões de regulação social se enfraqueceram ou desapareceram. Cenário despedaçado, nos sugere Dufour, que levou à grave crise financeira de hoje. O novo sujeito, além de tudo, habita um presente contínuo e imóvel. Argumenta Dufour que a nova religião do mercado "deixa um vazio quanto ao velho tormento humano da origem e do fim".

Na nova vida ultrapragmática de hoje - extremo paradoxo - há um aumento da necessidade de transcendência. Essa necessidade, alerta o filósofo, "pode permanecer dentro dos limites do razoável, mas pode ir até os delírios fundamentalistas". Não é por acaso, portanto, que o fundamentalismo de vários matizes se espalha pelo planeta; sua disseminação é o avesso de um vazio que a nova realidade do mercado acentua. É o vazio criado pelo deus mercado que exacerba a onda fundamentalista. Ela não passa de sua contrapartida. Assim como a ascensão dos dogmas é o avesso do desprestígio do pensamento crítico.

Acredita Dufour que muitos dos mais graves problemas contemporâneos estão associados a esse novo deus. Por exemplo, os escândalos de corrupção que ocupam, cada vez com mais frequência, as manchetes dos jornais. Afirma ainda que a corrupção - ao contrário do que em geral acreditamos - não pode mais ser vista na perspectiva da psicologia individual, como um desvio de conduta ou uma expressão da maldade. A corrupção, ele diz, é hoje um problema que está muito além do caráter e da moral.

"Como querer que um sistema que tem como fundamento o princípio do egoísmo não suscite inúmeras formas de corrupção?", Dufour pergunta. Para ele, a atual crise financeira fez "desabar um mito mantido cuidadosamente pela narrativa ultraliberal: aquele que afirma ser preciso distinguir os negócios saudáveis dos negócios suspeitos".

É evidente: não que todo mercado seja sujo e todo negócio, digno de desconfiança. "Nenhuma pessoa séria pode ser contra o mercado em geral", o filósofo argumenta. "Pela simples razão de que o mercado é como o pulmão: é por onde as pessoas respiram." Recorda Dufour, a propósito, a beleza de dois tradicionais mercados que visitou recentemente: o de Tepoztlán, no México, e o da Medina de Fez, no Marrocos. "Por que eles são tão bonitos? Simplesmente porque neles a economia está inserida no social." Em todos os tempos, acrescenta, o mercado soube integrar o princípio altruísta que dá à cultura o seu lugar.

Ao contrário, o que caracteriza o mercado da era ultraliberal é a destruição das culturas. "Ele é, abertamente, a promoção da anomia [a ausência de leis], a suspensão das interdições e de tudo o que possa interpô-las ao ímpeto dos apetites." Para Dufour, essas mudanças não só produzem um novo sujeito, obsessivo, perverso e deprimido, mas põem profundamente em questão a própria civilização.
Diz ainda Dany Dufour que, no mundo ultraliberal de hoje, "a distinção entre dois mundos, um perverso e outro moral, não somente não se sustenta como se trata de um puro trompe-l'oeil, ilusório e mentiroso". Não se trata de um problema de caráter ou da maldade deste ou daquele agente econômico em particular. Não é um problema pessoal, mas um problema estrutural.

Pensando novamente na crise econômica de agora, lembra Dufour que em 2000, nos Estados Unidos, eram lavados, a cada dia, cerca de US$ 1 milhão "provenientes de máfias diversas". Número que representava entre dois terços e a metade dos investimentos estrangeiros diretos. "O produto criminal bruto, no ano 2000, ultrapassava em muito 1 bilhão de dólares anuais, ou seja, 20% do comércio mundial." Para agravar a situação, a atividade econômica oficial pôs-se a fornecer, ela também, uma massa de capitais suspeitos.

Comenta Dufour: "Esses capitais corrompidos provêm de uma série de atividades bastante difundidas em grandes empresas, tal como demonstraram vários escândalos recentes". E enumera exemplos: cartéis, dumping, vendas forçadas, especulação, absorção e desmonte de concorrentes, balancetes falsos, manipulação de contabilidade, fraudes e evasão fiscal, desvios de créditos públicos, etc.

Lembra ele ainda - e a crise atual aí está como prova - que "o último estágio da dominação do capital financeiro sobre o capital industrial consistiu em diversas montagens de operações financeiras ultra-arriscadas, como o empréstimo em grande escala de dinheiro inexistente a pessoas que não tinham como pagar suas dividas". A desordem se instalou, a anomia tomou conta do mercado, e a crise que hoje enfrentamos se tornou inevitável.

Analisa: "Trata-se de um momento de regressão sem precedentes". Constatação que não o impede, porém, de conservar algum otimismo. Diz Dufour que aos indivíduos resta, em vez de consumir obsessivamente os objetos manufaturados que lhe prometem a felicidade, "trabalhar para desenvolver o objeto singular que só ele pode produzir". O investimento no singular se torna fundamental para a sobrevivência do indivíduo e para o desenvolvimento de uma comunicação viva com os outros homens.
A produção desses objetos singulares, seja na literatura, na música, na psicanálise, etc. -, "ainda são remédios, ou antídotos, à produção de indivíduos estandardizados", sugere. Ajuda a compreender que temos apenas uma vida e que, melhor do que permitir que ela seja manipulada, é "dar a essa única manhã de primavera, como dizia o filósofo, um sentido ou um sabor que só você pode dar".

Ministrando conferências pelo mundo, como a que pronunciou no dia 8 a convite do Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro, Dany Dufour tem ouvido, muitas vezes, que suas ideias colocam em palavras claras o que as pessoas hoje sentem de modo confuso. "Essa consciência de uma ameaça planando sobre nós existe. As pessoas esperam novas maneiras de reagir, distantes dos esquemas do passado, como 'a grande noite', 'a revolução' ou o que seja mais."

Em resumo: a expansão do divino mercado exige a produção de novas posições críticas e de novas estratégias que abandonem os velhos modelos de contestação e tenham a coragem de encarar o presente

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segunda-feira, 14 de junho de 2010

Cadernos de Hin�rio

Cadernos de Hin�rio: "'Como �que o Mestre vivia com o povo dele? Era plantando arroz, plantando feij�o, plantando macaxeira, plantando cana, plantando banana, para ter a fartura natural. Quer dizer: que essa aqui �a riqueza que o Mestre deixou na nossa m�o, foi essa tradi�o, esse conhecimento de trabalhar uma terra e da terra tirar o p�o de cada dia. (...) o Santo Daime, enquanto terap�utica alternativa, se realiza, a olhos vistos, n�o apenas no decorrer de suas sess�es e hin�rios festejados, mas tamb�m no esfor�o do trabalho com a terra, na enxada, no ter�ado, no machado, na p�e no aguador, para assim se receber as energias positivas e eliminar positivamente as negativas, regidos pelo movimento do Sol, da Lua e das Estrelas, sendo essa a sabedoria regeneradora para curar os homens das cidades ao reencontrarem sua harmonia profunda com a M�e Natureza, e assim serem mais felizes. Este �o exemplo do C�u do Mapi�.'"

segunda-feira, 31 de maio de 2010

DECLARAÇÃO DE REVOLUCIONÁRIOS CULTURAIS 2009


Declara Independência!

Esta é uma experiência aberta.
É um pôr em palavras de algo que já está no ar.
Quanto mais esta declaração for lida, pensada ou debatida, mais a sua energia se irá manifestar no nosso mundo e na nossa sociedade.
Se sentes que o que aqui segue escrito ressoa contigo, faz desta também a tua declaração. Procura maneiras de a reler, de a partilhar, e de a colocar em acção.

DECLARAÇÃO DE REVOLUCIONÁRIOS CULTURAIS 2009

Os Revolucionários Culturais, em 2009 …

-vivem, agem e trabalham com e não contra a natureza

-sabem que a vida é demasiado complexa para ser entendida a nível intelectual

-criam e apoiam economias locais e auto-reguladas

-valorizam e protegem a diversidade de qualquer tipo

-valorizam e praticam a interdependência, uma vez que sabem que nada é realmente independente

-consideram-se equivalentes a todas as formas de vida

-protegem e apoiam a vida

-amam e apoiam incondicionalmente as crianças

-trabalham em si mesmo para uma maior consciencialização

-estão familiarizados com os princípios ecológicos e integrám-nos nas suas vidas

-consideram a música e a dança como uma parte integrante da sua expressão e da sua comunicação

-vivem numa terra animada de vida e consideram-na como algo sagrado

-entregam-se e comprometem-se em benefício da sua comunidade

-sabem cultivar os seus próprios alimentos

-experienciam e apreciam a sua percepção sensorial

-celebram a vida

-cooperam

-deixam de pensar de forma “x ou x” para pensar de forma “x e x”

-partilham conhecimentos

-integrar o estar em processo como uma forma de ser e estar

-não se identificam com o seu corpo, nem com os seus pensamentos ou emoções

-vêem a mente como uma ferramenta

-apercebem-se de que não existe Bem ou Mal

-não se identificam com qualquer tipo de rótulo ou categoria social, nem com o seu passado ou o seu futuro

-estão conscientes de que a essência de quem eles são é a própria vida

-assumem a responsabilidade pelas suas emoções

-estão conscientes e valorizam as suas relações com tudo o que de vivo e aparentemente não vivo os rodeia

-valorizam e integram a sabedoria das mulheres

-valorizam e integram a sabedoria das culturas indígenas

-participam e investem em construir relacionamentos no lugar onde vivem

-valorizam o conhecimento generalista

-estão cientes que a mudança é um dos princípios fundamentais da evolução

-trabalham para a diversificação e descentralização

-evoluem do estado de consumidores dependentes para o de produtores responsáveis

-estão à procura de formas pelas quais os seus interesses e os seus talentos se possam desenvolver

-resistem e eventualmente desobedecem a qualquer lei que ilegalize formas de auto-governo, auto-produção e sustentabilidade

-estão informados sobre o actual sistema monetário e identificam-no como uma forma contemporânea de escravidão

-identificam e boicotam monoculturas biológicos, culturais, sociais e filosóficas

-boicotam monopólios de qualquer tipo

-questionam quem quer que promova uma única solução

-valorizam a ética ambiental e humana sobre qualquer tipo de maximização de lucros

-boicotam empresas e bancos que operem com fins puramente lucrativos e de maximização de lucros

-estabelecem terras e florestas como bem comum

-estabelecem a água como bem comum

-estabelecem a biodiversidade e o conhecimento como bem comum

-estão conscientes de que todo o tempo participam no processo de co-criação

-permitem que a vida se desenvolva através deles

Berlim, 03/2009

http://culturalrevolutionaries.org/